quinta-feira, 8 de abril de 2010

Não adianta culpar os céus pela tragédia no Rio


O Rio de Janeiro amanheceu debaixo d´água depois de uma madruga de chuva. As notícias da tragédia estão nos noticiários de hoje. Quando chove assim, todo mundo olha para o céu e procura os culpados lá em cima. Foi o El Niño? Foi o aquecimento global? Foi o acaso?

Por um lado, provavelmente, foi mero azar ter chovido tanto, e em abril. Foi extraordinário. Mas são eventos extremos que se repentem. Se chuvas assim acontecem com regularidade, então a cidade não pode se dar ao luxo de ter áreas vulneráveis.

Não dá para culpar o El Nino. O fenômeno este ano foi médio e já se dissipou. E ele aumenta chuvas no sul e reduz no Norte. No Sudeste, a cada vez vem diferente. Desta vez, a característica do El Nino foi travar as chuvas em SP e secar o Rio. No verão, enquanto São Paulo afundava, o Rio teve um verão ensolarado. O El Nino não teve responsabilidade pela tragédia do Rio desta vez.

Também não dá para culpar aquecimento global. Embora a concentração de carbono na atmosfera seja a maior da história da civilização, os efeitos ainda são irrisórios. O mar absorve a maior parte do excesso de carbono. E o sistema climático tem uma inércia para reagir à mudança da atmosfera. A gente só vai ver o clima ficar bizarro dentro de 10 anos. Até lá, o que teremos é um aumento na frequência de eventos extremos, que já ocorriam naturalmente.

E aí vem a irresponsabilidade das autoridades. Inclusive considerando que a chuva foi fora do normal. E o que Rio já é uma cidade mais resistente à chuvas do que SP, por exemplo. Choveu 324 mm em 24 horas. Para se ter ideia, aquela chuva que parou SP este ano foi de 112 mm. A maior chuva da história de SP foi de 151 mm em 1988. Mas no Rio chove muito. Chuvas assim acontecem de tempos em tempos. Não foi a primeira vez. Em uma das prefeituras do César Maia, em 1996, um temporal desses soterrou uma favela e dois condomínios chiques em Jacarépagua. Foi ali que o pessoal da Geotécnica aprendeu a calcular a saturação dos solo. Só não fizeram retirar as pessoas das áreas de risco, como se fez em Belo Horizonte e São Paulo, em alguns casos.

Um possível paralelo é New Orleans, nos Estados Unidos. A tragédia lá virou símbolo da vingaça do clima. Mas não dá para culpar a natureza. Ali sempre foi zona de furacão. O Katrina foi um furacão médio. Só que a cidade tinha uma barreira insuficiente para conter as águas. Deu no que deu.

Agora, é bom se precaver porque eventos extremos assim podem ficar mais frequentes nos próximos anos. As mudanças climáticas de verdade (quando os padrões do clima ficam irreconhecíveis) só vão começar a partir de 2020. Mas já nesta década teremos, segundo os pesquisadores, uma banalização dos eventos extraordinários. Os recordes que aconteciam a cada 20 anos e marcavam uma geração, começarão a se repetir com mais regularidade. É mais um bom motivo para acabar com as construções em lugares indevidos.

Fonte: Revista Época - Blog do Planeta