domingo, 26 de junho de 2011

Etanol de mandioca pode levar energia a comunidades isoladas da Amazônia


Há 130 anos, o americano Thomas Edison, criador da lâmpada incandescente, construiu em Nova York o primeiro sistema de distribuição de energia elétrica do mundo. Graças a ele, no conforto de sua casa, você hoje desliza o dedo no interruptor num movimento quase automático e a luz se acende. Mais de um século depois da invenção de Edison, milhares de ribeirinhos da Amazônia ainda vivem sem eletricidade da rede. Para conseguir energia, usam geradores movidos a óleo diesel quando o dinheiro permite. A luz vem de lamparinas ou velas. A energia faz falta nas atividades mais triviais – e você só percebe sua necessidade real quando ela não está disponível.

Certa vez, em uma viagem à Amazônia, fiquei por alguns dias hospedada em uma comunidade cabocla que passa grande parte do tempo no escuro. Na casa da família Silva, eram em três: o pai, a mãe e uma menina de 14 anos. O pai transformava a mandioca em farinha no puxadinho ao lado da casa para fazer um troco. A força que girava os equipamentos de moagem vinha dos braços. Na falta de uma geladeira, a mãe conservava a carne do animal morto no sal. Uma prática comum ali para garantir o alimento dos próximos dias. A garota, do auge de sua vaidade adolescente, pintava-se à luz de um lampião. À noite, a família parava todas as atividades para acompanhar uma novela. Mas eles só podiam assistir ao desenrolar da trama enquanto havia combustível. Quando o óleo acabava, a cada três dias, a diversão acabava também.

A comunidade, claro, não tinha um posto de combustível na esquina. O diesel vinha da cidade mais próxima, a mais de quatro horas. A família também não tinha um carro para ir até lá. Dependia da boa vontade do motorista de ônibus de uma linha local para levar o gerador até a cidade. O moço passava na frente da casa pela madrugada. A mulher acordava, entregava a máquina e pedia para reabastecê-la. Dois dias depois, o gerador voltava cheio – e a família podia novamente se reunir em frente à televisão. Sempre com um déficit de dois capítulos da novela.

Em breve, a rotina dessas famílias que ainda vivem com mais de um século de atraso pode ficar mais fácil. Pesquisadores da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e do Instituto Energia e Desenvolvimento Sustentável (Inedes) estão desenvolvendo um etanol de mandioca para abastecer os geradores da Amazônia. O projeto ainda está no início. Na próxima semana, eles vão começar a plantar quatro espécies do tubérculo na fazenda da Ufam. A ideia é construir uma pequena usina para transformar a mandioca em etanol até o final do ano. O projeto é uma iniciativa da Eletrobrás Amazonas Energia e teve investimentos de R$ 3,8 milhões. “Se der certo, vai ser o primeiro etanol de mandioca fabricado no Brasil”, afirma Rubem César Rodrigues Souza, coordenador do projeto pela Ufam. Além do ineditismo, o novo combustível pode revolucionar o fornecimento de energia para comunidades isoladas da Amazônia. E dar um pouco mais de conforto a famílias como a dos Silva.

Fonte: Revista Época

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